Acostumados a altas acima da inflação, os clientes de planos de saúde devem se preparar para um aumento de até 35% nas mensalidades ao longo do ano que vem. O percentual é uma estimativa do UOL para o reajuste previsto para 2021 somado à alta aprovada para 2020, mas que só será cobrada a partir do mês que vem.
Em razão da pandemia do novo coronavírus, a ANS (Agência Nacional de Saúde) suspendeu o reajuste de 8,14% sobre os planos individuais e de 15% sobre os planos coletivos (que abarcam 81% dos usuários) que seria aplicado este ano.
Ficou decidido que o aumento que valeria para setembro, outubro, novembro e dezembro será cobrado em 12 parcelas a partir de janeiro no ano que vem, mês em que o reajuste de 8,14% (planos individuais) e 15% (coletivos) também passará a valer.
Expectativa de aumento total em 2021: 35%
Por quê? A partir de janeiro, o usuário terá de pagar os 15% do reajuste médio suspenso em 2020. Também a partir de janeiro, ele pagará a primeira das 12 parcelas do aumento que deixou de ser cobrado entre setembro e dezembro, um acréscimo equivalente a 5% ao mês sobre o valor pago hoje.
Acontece que os planos também reajustarão a mensalidade em 2021, aumento que costuma ser acrescido ao boleto na data de aniversário de contratação do plano. O UOL considerou a repetição do reajuste médio deste ano (15%), o mesmo de anos anteriores, segundo o Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor).
Um usuário de 34 anos —que paga cerca de R$ 393 de plano, segundo tabela da ANS— chegará ao final do ano que vem desembolsando aproximadamente R$ 530, acréscimo de R$ 137, ou 35%.
Entenda o cálculo para os planos individuais
Expectativa de aumento em 2021: 18,9%
Por quê? A partir de janeiro, o usuário terá de pagar os 8,14% do reajuste suspenso em 2020. Também a partir de janeiro, ele pagará a primeira das 12 parcelas do aumento que deixou de ser cobrado entre setembro e dezembro, um acréscimo equivalente a 2,71% sobre o valor pago hoje.
Como os planos também reajustarão a mensalidade em 2021 no aniversário de contratação do plano, o UOL considerou a repetição do reajuste deste ano (8,14%), embora a média de aumento tenha sido de 9,9% nos últimos 10 anos.
Um usuário de 34 anos —que paga em média R$ 458 de plano, segundo tabela da ANS— chegará ao final de 2021 desembolsando aproximadamente R$ 544, acréscimo de R$ 86, ou 18,9%.
Entidades tentam cancelar aumento
“Muitas pessoas não estão se dando conta de que essa cobrança retroativa vai chegar em janeiro junto com a correção. E, ao longo de 2021, um novo índice será aplicado e se somará a esses valores que começarão a ser cobrados em janeiro. Será um impacto profundo nas contas dos brasileiros em plena pandemia”, disse Rafael Robba, advogado especialista em direito à saúde do escritório Vilhena Silva.
Insatisfeitos com o reajuste aplicado este ano, o Idec se uniu à Defensoria Pública e pediu à ANS que abra os dados financeiros do setor para comprovar a necessidade de parcelar o aumento de 2020 ao longo do ano que vem.
Em outubro, o Idec também pediu na Justiça o cancelamento de todos os reajustes repassados entre março e agosto.
A justificativa é a lucratividade das operadoras durante a crise sanitária, que já chega a R$ 29,8 bilhões entre março e setembro, de acordo com o último boletim da agência. No período, as empresas receberam de seus segurados um total de R$ 101,3 bilhões em mensalidades, mas repassaram R$ 71,5 bilhões a hospitais e clínicas.
O dinheiro extra se deve aos cancelamentos e adiamentos de serviços médicos por conta da pandemia. Ainda segundo a ANS, a taxa que mede o número de vezes em que os planos foram acionados caiu de 79% (média dos últimos quatro anos) para 62% em junho (o mais baixo do ano), quando passou a se recuperar lentamente, atingindo 73% em setembro.
Para a coordenadora de Saúde do Idec, Ana Carolina Navarrete, a ANS deveria revogar o parcelamento do reajuste para que as operadoras “socializem esse lucro recorde com quem está desempregado e sem renda”.
O que dizem ANS e planos
Segundo a ANS, ela fez o possível ao adiar o reajuste deste ano e “diluir o pagamento” em 2021 a fim de “minimizar o impacto aos beneficiários e preservar os contratos”.
A agência diz em nota que o reajuste respeitou as despesas de 2018 e 2019, “período anterior à pandemia”, e que a redução da oferta de serviços médicos só será percebida “no reajuste referente a 2021”.
É também o que defende a FenaSaúde (Federação Nacional de Saúde Suplementar), que reúne os 16 maiores planos. Para a entidade “não faz nenhum sentido” suspender os reajustes “definidos pela ANS” em função de resultados financeiros, “que são parciais, registrados por algumas operadoras na pandemia”.
“A não aplicação de reajustes, como pretende o Idec, converge para desequilibrar os contratos existentes, comprometer a prestação dos serviços e penalizar justamente quem, supostamente, se pretende defender: os consumidores”, declaou a FenaSaúde (Federação Nacional de Saúde Suplementar), em nota.
Assim como Navarrete, do Idec, a Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva) divide a responsabilidade dos aumentos com a agência reguladora.
“A ANS se omitiu e agiu apenas quando foi pressionada por questões políticas”, afirma José Sestelo, pesquisador, doutor em saúde coletiva e membro da Abrasco. Ele se refere à suspensão do reajuste em agosto, ocorrida apenas depois que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), pressionou a ANS.
“As empresas estão se aproveitando de uma situação de calamidade para manter seus níveis de ganho às custas de uma população sacrificada. Se a saúde é um bem de relevância pública, ela não pode ser tratada como mercadoria”, afirmou José Sestelo, membro da Abrasco e pesquisador da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
A FenaSaúde rebate: “Desde o início da pandemia, as operadoras associadas à FenaSaúde vêm empreendendo seus melhores esforços para permitir que os beneficiários mantenham seus planos, tendo, inclusive, suspendido voluntariamente os reajustes por 90 dias entre maio e julho.”