O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2020 começa neste domingo (17) para 5,78 milhões de candidatos confirmados, em meio à alta no número de casos de coronavírus.
No Amazonas, mais de 160 mil candidatos farão a prova em 23 e 24 de fevereiro. A medida foi tomada para conter o caos no sistema de Saúde do estado, que enfrenta hospitais lotados e falta de oxigênio.
Até as 20h deste sábado (16), treze estados registravam alta nas mortes: AL, AM, GO, MG, MT, PE, PI, RJ, RN, RR, SE, SP e TO. Eles somam 3,1 milhões de inscritos no exame (54,25% do total).
O Enem é considerado o maior vestibular do país, e a nota serve para disputar vagas em universidades e ter acesso a programas de bolsas (Prouni) ou financiamento de mensalidade (Fies). Candidatos ouvidos pelo G1 dizem estar pressionados entre o sonho de ter uma graduação e o risco de se contaminar.
Os estudantes terão 5h30 neste domingo (17) para escrever a redação e responder a 90 questões de múltipla escolha (45 de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias e 45 de Ciências Humanas e suas Tecnologias).
No próximo domingo (24), serão 5h para responder a mais 90 questões de múltipla escolha (45 de Matemática e suas Tecnologias e 45 de Ciências da Natureza e suas Tecnologias).
A aplicação do Enem tem sido alvo de disputas judiciais, devido à pandemia. A prova, prevista originalmente para novembro de 2020, foi adiada para janeiro deste ano – mesmo após enquete com participantes indicar o mês de maio de 2021 como a opção mais votada pelos estudantes. Segundo o governo, a prova em maio atrasaria o cronograma de outros programas de ingresso no ensino superior.
Maior prova do país no pior momento da pandemia
Mas, após as eleições e festas de fim de ano, os números da pandemia não pararam de crescer.
A Defensoria Pública da União e entidades estudantis haviam pedido o adiamento da prova em todo o país, alegando risco à saúde da população devido ao deslocamento e aglomeração de alunos em salas de prova. O pedido foi negado. A decisão afirmava que em locais onde haveria necessidade de restringir a circulação de pessoas, as autoridades locais poderiam impedir o Enem.
A Justiça do Amazonas determinou a suspensão das provas no estado. Um decreto do governo confirmou a restrição. As Defensorias Públicas do Rio, Mato Grosso e Paraná também pediram a suspensão do exame, mas até o momento, só AM teve data remarcada.
O Enem tem uma data oficial de reaplicação (23 e 24 de fevereiro) para atender candidatos que possam ter problemas de infraestrutura, como falta de luz, por exemplo. A prova é montada com questões diferentes, mas com o mesmo nível de dificuldade. Nesta edição, o benefício foi estendido a quem tiver diagnóstico confirmado de Covid. Estas são as mesmas datas do Enem para pessoas privadas de liberdade (Enem PPL).
Em entrevista ao G1, o presidente do Inep, Alexandre Lopes, disse que haveria problemas logísticos para atender o caso do Amazonas por causa da situação na pandemia.
“No Amazonas, tenho locais que não chego de avião. Tem que levar a prova para Manaus, botar em barco, levar, trocar de barco, botar em bicicleta, moto. O Brasil é complicado, é muito grande. Não posso assegurar que vou conseguir reimprimir uma cidade inteira. Não há garantia”, alerta.
Na noite de sexta, o Inep anunciou nas redes sociais que aplicará o Enem no estado do Amazonas nos dias 23 e 24 de fevereiro. “O Inep e o MEC irão unir esforços institucionais em parceria com o governo do Amazonas”, afirma a publicação.
Questionado pelo G1 se haveria condições logísticas para distribuir mais de 160 mil provas e levar aos locais de prova no Amazonas, o Inep não respondeu até as 7h deste domingo (17).
Cuidados com a prova na pandemia
Infectologistas ouvidos pelo G1 dizem que o risco de pegar Covid-19 é maior nos deslocamentos até o local da prova do que durante a avaliação. Nas salas de provas, a dica é ficar de olho na ventilação adequada.
“A gente fica falando para todo mundo se manter nas suas bolhas sociais e, agora, vai estourar a bolha no Brasil todo ao mesmo tempo. É irresponsável”, afirma Ethel Maciel, epidemiologista e professora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).
“São jovens que deveriam estar evitando aglomerações e que vão ser forçados a sair de casa, a pegar transporte público e a talvez encontrar grandes grupos nos corredores e portões”, afirma Alexandre Naime Barbosa, chefe da infectologia da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp) e consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI). “Se for ver todo o processo, a realização da prova em si é o menor dos perigos. A mudança de rotina, sim, vai impactar o número de casos.”
Vitor Mori, membro do Observatório Covid-19 BR e pesquisador na Universidade de Vermont, nos Estados Unidos, aponta a ventilação das salas de prova como outro ponto crítico na realização do Enem. Para ele, não tem sentido discutir percentual de ocupação de salas de aula ou distanciamento em metros se não houver ventilação suficiente.
“Falam de ventilação de forma superficial. E a principal transmissão é pelo ar. Se não tiver protocolos sérios de troca de ar e monitoramento, não tem como garantir proteção das pessoas”, afirma. Mori defende que deveria haver um controle dos níveis de gás carbônico nas salas de aula para checar se a troca de ar ocorre de forma correta.
“Sempre argumento que estamos parados na concepção da pandemia de março. Não atualizou [os protocolos]. Quando os protocolos são errados e não funcionam, os casos aumentam.”
“Essa coisa do 1,5 metro parte do princípio de que a transmissão acontece por gotículas maiores. Quando a gente fala, tosse, espirra, a gente emite partículas maiores, mais pesadas, que caem a distância mais curta. Mas a transmissão também ocorre por partículas mais leves, aerossóis, que ficam flutuando no ar e se espalham na sala. É como fumaça de cigarro. Você sente o cheiro, mesmo estando a mais de 1,5 metro. Em ambientes fechados, o que importa mais é a ventilação”, afirma.