Militares e auxiliares do entorno mais próximo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) convocaram reuniões com militares “kids pretos” — também chamados de “forças especiais” (FE) — para atuarem em atos antidemocráticos, ajudando os golpistas. É o que apontam as investigações da Polícia Federal (PF), que deflagrou nesta quinta-feira (8) uma operação contra o ex-presidente, seus ex-assessores e ex-ministros.
Segundo fontes da investigação ouvidas pela TV Globo, dos 22 alvos, pelo menos oito são kids pretos:
(veja mais abaixo o que dizem os alvos da operação)
Marcelo Câmara, coronel do Exército citado em investigações como a dos presentes oficiais vendidos pela gestão Bolsonaro e a das supostas fraudes nos cartões de vacina da família Bolsonaro;
Rafael Martins, major das Forças Especiais do Exército;
Bernardo Romão Corrêa Netto, coronel do Exército;
Braga Netto, ex-ministro da Defesa e candidato a vice de Bolsonaro em 2022;
Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI);
Cleverson Ney Magalhães, coronel do Exército e ex-oficial do Comando de Operações Terrestres;
Guilherme Marques Almeida, coronel do Exército e ex-oficial do Comando de Operações Terrestres;
Sergio Ricardo Cavaliere de Medeiros, major do Exército.
Kids pretos são militares da ativa ou da reserva do Exército, especialistas em operações especiais. Eles são treinados para participar de missões com alto grau de risco e sigilo. O trabalho inclui operações de guerra irregular — terrorismo, guerrilha, insurreição, movimentos de resistência, insurgência (veja detalhes mais abaixo).
Além disso, os kids pretos são preparados para situações que envolvem sabotagem, operações de inteligência, planejamento de fugas e evasões. Segundo o Exército, atualmente o grupo tem um efetivo aproximado de 2,5 mil militares.
Conforme documento divulgado pela PF, o entorno de Bolsonaro discutiu com o ex-presidente medidas antidemocráticas para reverter o resultado das eleições de 2022, incluindo o “emprego de técnicas e militares com formação em Forças Especiais [kids pretos] para os atos direcionados à execução do golpe de Estado”.
Ainda segundo a PF, reuniões eram feitas por integrantes do governo e militares da ativa para:
Encaminhar orientações aos manifestantes de como agirem;
Mostrar locais de atuação;
Financiar e respaldar ações dos manifestantes, por meio da Forças Armadas.
“Os fatos identificados indicam, ainda, a possível arregimentação de militares com formação em forças especiais para atuarem no cenário de interesse, ou seja, nas manifestações golpistas”, destaca o documento.
Como é o treinamento dos ‘kids pretos’?
De acordo com o Exército, a nomenclatura “kid preto” é um apelido informal atribuído aos militares de Operações Especiais do Exército Brasileiro, pelo fato de usarem um gorro preto. O processo seletivo para as Forças de Operações Especiais é realizado entre militares voluntários que realizam curso de Ações de Comandos e de Forças Especiais, segundo o Exército.
Como parte do treinamento, os militares aprendem a atuar em missões com alto grau de risco e sigilo, como em operações de guerra irregular — terrorismo, guerrilha, insurreição, movimentos de resistência, insurgência. Além disso, são preparados para situações que envolvam sabotagem, operações de inteligência, planejamento de fugas e evasões.
Ainda de acordo com o Exército, os kids pretos podem atuar em todo o território nacional. No entanto, a corporação afirma que as tropas especiais só são empregadas por ordem do Comando do Exército, sob coordenação do Comando de Operações Especiais.
“Sempre com base em um arcabouço legal, respeitando regras de engajamento previstas para a sua atuação operacional”, disse o Exército em nota enviada ao g1.
‘Kids pretos’ teriam facilitado entrada de golpistas no Congresso
Imagens dos atos terroristas em Brasília, no dia 8 de janeiro de 2023, mostram o momento em que golpistas invadiram e vandalizaram o Congresso Nacional, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Palácio do Planalto.
A TV Globo apurou que uma frente da investigação da PF busca identificar supostos integrantes das Forças Especiais do Exército, os chamados “kid pretos”, que teriam dado início às invasões às sedes dos Três Poderes.
Nos vídeos, é possível ver que homens com o rosto coberto por balaclavas e usando luvas retiraram as grades da escotilha do Congresso Nacional. Em um outro momento, eles usaram gradis para ajudar os invasores a sair de dentro do prédio – além de uma mangueira para jogar água e dispersar o gás das bombas de efeito moral.
No inquérito da Polícia Federal, existem vários depoimentos de vândalos presos relatando a ação de indivíduos de balaclavas e luvas ajudando e incentivando os demais a entrarem no prédio.
Segundo os depoimentos, eles chamaram os invasores depois de abrirem as escotilhas de acesso ao teto do Congresso. A subida até lá só teria sido possível por causa de uma escada feita com gradis amarrados.
O que dizem os alvos
Marcelo Câmara, coronel do Exército
“Meu cliente está preso e ter acesso aos autos é fundamental para que possamos tomar as providências cabíveis”, afirmou o advogado Eduardo Kuntz.
Bernardo Romão Corrêa Netto, coronel do Exército
“O Centro de Comunicação Social do Exército informa que o referido militar encontra-se realizando curso nos EUA, no período de 2023 a 2025, para o qual foi designado em 2021. Tão logo foi publicada a decisão judicial, foram tomadas as providências para retorno do militar ao Brasil”, informou o Exército, em nota.
O g1 tenta contato com as defesas dos demais investigados.