Embora alguns estados brasileiros comecem a anunciar restrições às festas de Natal e Ano Novo para conter a pandemia do novo coronavírus, a medida ainda enfrenta resistência por parte do governo federal e seus apoiadores, que na sexta-feira (4) tornaram popular a hashtag #VaiTerNatalSim. Para infectologistas ouvidos pelo UOL, a falta de sintonia entre as autoridades acerca das restrições resultará em aumento de infecções e um janeiro complicado.
País de forte tradição natalina, a Itália decidiu desestimular as festas em 2020. Um decreto com medidas rígidas entre 21 de dezembro e 6 de janeiro antecipou até a Missa do Galo, que neste ano ocorrerá duas horas antes.
Por lá, será proibido deslocamentos depois das 22h e viagens entre as regiões do país nessas datas. As ceias estão vetadas em hotéis e o premiê Giuseppe Conte chegou a pedir “fortemente que não sejam recebidas em casa pessoas com quem não se convive”.
No Brasil, o estado de São Paulo proibiu Réveillon em bar, restaurante e hotel e recomenda que as celebrações não reúnam mais do que dez pessoas. Em Belo Horizonte, a prefeitura proibiu o consumo de bebida alcoólica em bares, restaurantes e lanchonetes a partir do dia 7 de dezembro. Assim com São Paulo, Rio Grande do Sul suspendeu as festas de fim de ano.
Em nível federal, do entanto, o silêncio sobre o assunto sugere que o governo deixará as medidas restritivas a cargo dos outros entes da federação, o que é um erro, dizem os infectologistas, consultores da SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia).
Autoridades batem cabeça
“Há diferentes posições entre estados, municípios e União”, diz o infectologista Valdez Ramalho Madruga. “Tem governador que mandou cancelar evento, mas tem prefeito querendo fazer, enquanto o presidente trata a doença como ‘gripezinha’. A população fica sem saber a quem obedecer.”
“Falta postura, uma liderança. Não vai dar certo se cada estado fizer do seu jeito”, afirma a infectologista Eliana Bicudo, para quem “a segunda onda já chegou”.
“Estou falando como médica que cuida de paciente com covid-19. Cheguei a ter calmaria em outubro e novembro, e agora um boom de novo, como em junho e julho”, diz. “Precisamos centralizar as diretrizes para que os estados as cumpram.”
“O governo federal tem de se posicionar quanto às festas, ou teremos um janeiro sombrio. A saúde pública, a vigilância sanitária e governos têm de se posicionar ou não vamos segurar a situação em janeiro”, disse Eliana Bicudo, infectologista.
Natal x Ano-Novo
“Infelizmente, o Natal e Ano-Novo precisam ser diferentes do tradicional em 2020”, afirma o infectologista Leonardo Weissmann. “A gente sabe que é um momento de confraternização familiar, mas não existe Natal, Ano Novo ou horário restrito ao vírus.”
Eliana Bicudo diz que as autoridades falam em “um número mágico de dez pessoas em um ambiente”, mas que “não é bem assim”.
“Depende do tamanho desse ambiente, que tem de ser bem ventilado e com número proporcional de pessoas. Também é bom fazer algumas perguntas antes do convite: ‘Você está bem, teve contato com algum infectado?’. Se a resposta for positiva, não vá à festa”, diz.
Bicudo defende restrição nos dois encontros, mas com rigor diferente. Ela lembra que o Natal é uma festa familiar, “imagino que a gente vá conseguir reunir menos pessoas”. Já o Réveillon “não é familiar”.
“É uma festa de aglomeração. Neste ano, não pode ter Réveillon”, defende. “Que não haja queima de fogos nem grandes apresentações de música, porque isso tudo aglomera.”
Ela lembra que Natal e Ano-Novo são confraternizações em “que beber e comer é a base”, o que obriga as pessoas a ficarem sem máscara.
“É perfeitamente compreensível que a economia precise girar, os comerciantes precisem trabalhar, mas é necessário conscientização da população e não apenas imposição de medidas. Leonardo Weissmann, infectologista.
Enquanto isso, parte da sociedade é contra qualquer restrição nos últimos dias do ano. Na sexta, um movimento nas redes sociais tornou popular a hashtag #VaiTerNatalSim.