Os jogadores da seleção brasileira já sinalizaram para a CBF a decisão de que irão atuar na Copa América. Mas farão um manifesto com crítica à realização do torneio no Brasil. O afastamento do presidente da confederação, Rogério Caboclo — denunciado por assédio sexual —, reduziu a tensão entre o time e a cúpula da entidade. Pesou também na decisão deles que dirigentes garantiram ao técnico Tite sua permanência.
A informação sobre a desistência do boicote foi publicada primeiramente pelo “GE” e confirmada pelo UOL.
Desde a saída de Caboclo, dirigentes da CBF têm trabalhado para desanuviar o ambiente com os atletas. O novo mandatário é o Coronel Nunes, vice-presidente mais velho. Na prática, um grupo de vices e diretores tem atuado no comando da entidade.
Neste sentido, a primeira meta era garantir a permanência de Tite como técnico e acabar com a insegurança no campo. A diretoria remanescente na CBF tratou de lidar diretamente com o treinador para reforçar o compromisso pela continuidade no trabalho e, ao mesmo tempo, tirar dele a desconfiança gerada pela condução da CBF com Rogério Caboclo.
O coordenador de seleções, Juninho Paulista, também foi acionado para contornar a história. Amanhã (8), o time volta a campo ainda pelas Eliminatórias da Copa do Mundo para enfrentar o Paraguai, em Assunção. Em reunião na tarde de hoje, a CBF vai decidir se outro membro da diretoria irá ao Paraguai para o jogo.
De outra parte, houve um trabalho para aliviar a relação com os atletas e garantir que jogassem a Copa América. Nunca ficou claro se a oposição dos jogadores ao torneio de fato levaria ao boicote. De todo modo, o comando atual da CBF não vai se opor ao protesto que está sendo articulado dentro do vestiário.
Na semana passada, o clima era bem tenso entre as partes. Isso se reduziu com a saída de Rogério Caboclo da presidência, após decisão da comissão de ética.
Pessoas ligadas aos jogadores indicaram ao UOL que o boicote à Copa América sempre foi uma opção extrema caso Caboclo não mudasse de postura. E também há a preocupação de não carregar a postura dos convocados na direção de um debate político-partidário.
No ambiente da seleção, que se fechou antes da vitória contra o Equador em Porto Alegre, já foi possível ver Neymar dançando ao som de uma música no quarto. Em outro momento, Richarlison se descontraiu cantando funk em vídeo postado nas redes.
Depois do triunfo sobre os equatorianos pelas Eliminatórias, o volante e capitão Casemiro disse que a seleção tinha uma opinião unânime sobre a realização da Copa América no Brasil, mas afirmou que ela só seria divulgada após a partida contra o Paraguai.
“Não podemos falar do assunto, todos sabem nosso posicionamento, mas não vamos falar desse assunto. Todo mundo sabe nosso posicionamento, está mais claro impossível, Tite deixou claro para todo mundo o que nós pensamos da Copa América. Existe um respeito, uma hierarquia que temos que respeitar, queremos dar nossa opinião e aconteceram muitas coisas. Queremos falar, mas não queremos desviar o foco [das Eliminatórias], porque isso para nós é Copa do Mundo”, disse.
O Brasil foi confirmado como sede improvisada da Copa América nesta semana, restando menos de 15 dias para a abertura da competição. Depois de um pedido da Conmebol, a CBF recorreu ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido), e o país foi anunciado como novo anfitrião em razão de problemas sanitários e políticos envolvendo as sedes originais do torneio, Argentina e Colômbia.
A discussão não envolveu a jogadores e comissão técnica da seleção. Insatisfeitos por não terem sido ouvidos nesta decisão, especialmente em um momento de contexto político delicado no país envolvendo a pandemia do coronavírus, os jogadores se reuniram inicialmente com Tite e o coordenador Juninho Paulista.
Depois, solicitaram uma agenda com Caboclo, que viajou do Rio de Janeiro a Teresópolis só para isso. O encontro foi realizado na quarta-feira, na Granja Comary, e uma das principais pautas foi a falta de diálogo da entidade com o grupo, além de questões sanitárias. A reação do presidente deixou o ambiente na seleção mais inflamado.
Antes da vitória sobre o Equador em Porto Alegre, Caboclo protagonizou momento de constrangimento junto aos atletas da seleção. Aparentemente alcoolizado, o dirigente tentou fazer um discurso para incentivar os atletas e não conseguiu nenhuma palavra em troca. De acordo com bastidores colhidos pela reportagem, todos os envolvidos olhavam para o chão para evitar contato visual com o cartola. Ele chegou a forçar apertos de mão e abraços e foi retribuído quase que por educação. Dois dias depois, Caboclo foi afastado.
Manifesto coletivo
Os capitães das dez seleções que participarão da Copa América no Brasil elaboram manifesto no qual pretendem demonstrar insatisfação por disputar a competição em meio à pandemia. A possibilidade de um boicote coletivo perdeu força no fim de semana, informou o colunista do UOL Esporte Marcel Rizzo.
A Conmebol tem conhecimento desse documento e não pretende interferir. Manifestações durante os jogos ou treinos quando a competição estiver em andamento são proibidas pela Fifa, que não permite atos considerados políticos, mas os jogadores avaliam gestos coordenados, como abraço dos 22 em campo durante o minuto de silêncio pelas vítimas da covid-19.
O teor do texto não está fechado. O foco deve ser solidariedade a todas as vítimas da covid-19 e pedido por segurança para o futebol acontecer em meio à pandemia. Como a Fifa proíbe manifestações políticas não deve haver críticas diretas à Conmebol ou associações, mas a ideia é que o documento deixe claro a insatisfação pelo não adiamento da Copa América.
Danilo Lavieri, Igor Siqueira e Rodrigo Mattos
Do UOL, no Rio de Janeiro e em São Paulo